Adeus,
meus sonhos, eu pranteio e morro!
Não
levo da existência uma saudade!
E
tanta vida que meu peito enchia
Morreu
na minha triste mocidade!
Misérrimo!
Votei meus pobres dias
À
sina doida de um amor sem fruto,
E
minh'alma na treva agora dorme
Como
um olhar que a morte envolve em luto.
Que
me resta, meu Deus?
Morra
comigo
A
estrela de meus cândidos amores,
Já
não vejo no meu peito morto
Um
punhado sequer de murchas flores!
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Minha
desgraça não é ser poeta,
Nem
na terra de amor não ter um eco,
E
meu anjo de Deus, o meu planeta
Tratar-me
como trata-se um boneco...
Não
é andar de cotovelos rotos,
Ter
duro como pedra o travesseiro...
Eu
sei... O mundo é um lodaçal perdido
Cujo
sol (quem mo dera!) é o dinheiro...
Minha
desgraça, ó cândida donzela,
O
que faz que o meu peito blasfema,
É
ter para escrever todo um poema
E
não ter um vintém para uma vela.
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Já
da noite o palor me cobre o rosto,
Nos
lábios meus o alento desfalece,
Surda
agonia o coração fenece,
E
devora meu ser mortal desgosto!
Do
leito, embalde num macio encosto,
Tento
o sono reter!... Já esmorece
O
corpo exausto que o repouso esquece...
Eis
o estado em que a mágoa me tem posto!
O
adeus, o teu adeus, minha saudade,
Fazem
que insano do viver me prive
E
tenha os olhos meus na escuridade.
Dá-me
a esperança com que o ser mantive!
Volve
ao amante os olhos, por piedade,
Olhos
por quem viveu quem já não vive!
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Em
12 e Setembro de 1831, nascia em São Paulo, Manuel Antônio Álvares de
Azevedo. Filho de Inácio Manuel Álvares de Azevedo e Maria Luiza Mota
Azevedo, o poeta, contista e ensaísta Álvares de Azevedo, teria
nascido na sala da biblioteca da Faculdade de Direito de São Paulo; porém,
foi constatado que o nascimento se deu na casa do avô paterno, Severo
Mota.
Filho
de família ilustre, mudou-se para o Rio de Janeiro em 1833, e em 1840
ingressou no Colégio Stoll; retornando a São Paulo em 1844. Regressou
para o Rio de Janeiro no ano seguinte e matriculou-se no Colégio Pedro
II. Finalmente, em 1848 entrou para a Faculdade de Direito de São
Paulo. Tendo uma vida literária intensa, Álvares de Azevedo foi
fundador da Revista Mensal da Sociedade Ensaio Filosófico Paulistano.
Fortemente
influenciado por Lord
Byron e Musset, Álvares de Azevedo inseriu em suas poesias
elementos da linguagem desses escritores. A melancolia e a presença
constante da morte eram temas perenes em suas obras.
Álvares
de Azevedo era de pouca vitalidade e o desconforto das repúblicas
aliado ao esforço intelectual intenso, enfraqueciam sua saúde. Entre
1851 e 1852, manifestou-se a tuberculose pulmonar, agravado por uma lesão
ocasionada numa queda de cavalo ocorrida no mês anterior. Sofreu uma
intervenção cirúrgica que não surtiu efeito, e faleceu às 17 horas
no dia 25 de Abril de 1852. Se eu morresse amanhã foi escrita dias
antes de sua morte e lida no enterro por Joaquim Manuel Macedo. Álvares
de Azevedo era amigo de Bernardo Guimarães, Aureliano Lessa e José
Bonifácio; com que dividiu as acomodações da Chácara dos Ingleses,
em São Paulo.
Entre
1848 e 1851, publicou alguns poemas, artigos e discursos. Depois da sua
morte surgiram as Poesias (1853 e 1855), cujas edições sucessivas
uniram-se aos outros escritos, alguns dos quais publicados antes em
separado. As obras completas, como as conhecemos hoje, compreendem: Lira
dos vinte anos, Poesias diversas, O poema do frade e O conde Lopo,
poemas narrativos; Macário, "tentativa dramática"; Noite na
taverna, contos fantásticos; a terceira parte do romance O livro de Fra
Gondicário; os estudos críticos sobre Literatura e civilização em
Portugal, Lucano, George Sand, Jacques Rolla, além de artigos,
discursos e 69 cartas.
Preparada
para integrar As três liras, projeto de livro conjunto de Álvares de
Azevedo, Aureliano Lessa e Bernardo Guimarães, a Lira dos vinte anos é
a única obra de Álvares de Azevedo cuja edição foi preparada pelo
poeta. Vários poemas foram acrescentados depois da primeira edição (póstuma),
à medida que iam sendo descobertos.
A
característica intrigante de sua obra reside na articulação
consciente de um projeto literário baseado na contradição, talvez a
contradição que ele próprio sentisse, na condição de adolescente.
Perfeitamente
enquadrada nos dualismos que caracterizam a linguagem romântica, essa
contradição é visível nas partes que formam sua obra principal, Lira
dos Vinte Anos. A primeira e a terceira partes da obra mostram um Álvares
adolescente, casto, sentimental e ingênuo. Já a segunda parte
apresenta uma face irreverente, irônica, macabra e por vezes orgíaca e
degradada de um moço-velho, isto é, um jovem em conflito com a
realidade, tragado pelos vícios e amadurecido precocemente.
Resta
lembrar que a obra de Álvares de Azevedo apresenta linguagem inconfundível,
em cujo vocabulário são constantes as palavras que expressam seus
estados de espírito, a fuga do poeta da realidade, sua busca incessante
pelo amor, a procura pela vida boêmia, o vício, a morte, a palidez, a
noite, a mulher... Em Lembrança de morrer, está o melhor retrato dos
sentimentos que envolvem sua vida, tão próxima de sua obra poética:
"Descansem o meu leito solitário/ Na floresta dos homens
esquecida,/ À sombra de uma cruz e escrevam nela:/ - Foi poeta, sonhou
e amou na vida."
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